quarta-feira, 18 de junho de 2008

O que há entre a escrita de Charles Bukowski e a arte de Robert Crumb?



•••••••••••••••••• Crumb Crumb Crumb Crumb ••••••••••••••••••••
••••••••••••••• Buk Buk Buk Buk ••••••••••••••••••
Es tan fácil ser poeta

y tan difícil ser hombre.

(Charles Bukowski)



Traço sujo. Detalhes em exagero: tipo, azeitona que apodrece sobre o mofo do que um dia foi um drinque. Isso é Crumb, para mim, bien sûr. Para mim, que leio Bukowski e me babo pela maneira simples, direta, dura, podre no sentido sincero do coração de um homem - apenas um homem.

Isso faz lembrar que este mesmo homem, o Buk, velho Buk, foi encontrado [por si mesmo] sobre uma lata de lixo, todo vomitado, um rato passeando sobre a perna, numa clássica manhã de ressaca.

Buk: Parte da geração beatnik, mas à parte: ele, o eterno marginal.

O Charles "Hank" Bukowski era alemão: nasceu em Adernach e o pai era americano, primeiro sargento. A mãe, alemã. Dizque o pai era muito feio. Aos três anos, mudou-se com a família para os EUA, para o East Holywood, condomínio moquifento de baixa renda, periferia de Los Angeles. Ali conheceu a miséria. Abusos do pai, alcoólatra. Depois de terminar o segundo grau, estudou jornalismo durante algum tempo no L.A. City College, mas abandonou o curso em 1941, antes de conseguir qualquer graduação. Escolheu a vida bêbada e itinerante, pulando de um emprego para o outro. Em 1956, resolveu dar um tempo: aceitou trabalhar nos correios, lugar que serviu de inspiração para o seu primeiro livro de prosa, "Cartas na Rua" (1971).

Mas Bukowski foi também um putapoeta, e publicou diversos livros de poesia. Olha só:


<< Play the piano drunk like a percussion instrument until the fingers begin to bleed a bit 40,000 Moscas>>

Separados por uma tormenta passageira

nos juntamos novamente

Buscamos rachaduras em paredes

e tetos e as eternas aranhas

Me pergunto se haverá uma mulher mais.

Agora 40,000 moscas

encontram os braços de minha alma cantando:

"I met a million dollar baby in 5 and 10 cent store"

Braços de minha alma?

moscas?

cantando?

que classe de merda é esta?

É tão fácil ser poeta e tão difícil ser homem."


Homem de vícios, esse Buk. No traço de Crumb, sua cara de ressaca fica ainda pior, as bitucas de cigarro quase exalam seu fedor.

Os vícios: corridas de cavalos, Jack Daniel's, cerveja, cigarros e mulheres, mais ou menos na ordem em que aparecessem em sua frente. Apesar de estar bêbado em praticamente quase todos os momentos de sua vida, foi um homem tão lúcido quanto pode sê-lo um escritor americano que manda às favas o sistema, foi insano em maneiras de viver a vida, tragá-la como um gole de uísque, até a última gota.

Mesmo com a fama já fazendo-lhe calos à imagem, "Hank" não abriu mão dos caprichos, não deixou de freqüentar os botecos, de ir ao cinema ou de resmungar ao amarrar os sapatos pela manhã; não abriu mão de seu amor aos gatos, às boas coisas que o dinheiro traz e que leva embora sem dar satisfação; mas, principalmente, não abriu mão nunca de escrever: como respirar, dormir, comer. Escreveu feito um faminto ensandecido diante de um carneiro assado se atira à refeição, escreveu sempre, enquanto esteve com os olhos abertos.

<< Não há nada a lamentar sobre a morte, assim como não há nada lamentar sobre o crescimento de uma flor. O que é terrível não é a morte, mas as vidas que as pessoas levam até a sua morte.>> (C. B.)

Na medula, sem floreios ou eufemismos: as mulheres de bundas e peitos rechonchudos, como se estourando de leite, ar vulgar, a boca aberta num sorriso sacana - isso fecha perfeito com o traço das idéias do velho safado. Quem é quem? Não posso lembrar de Buk sem trazer junto Robert Crumb, ou o contrário. Se o mundo bizarro das corridas de cavalos, da noite de Nova York, ou do cotidiano simples de uma mente inquieta, se todo esse material precisou dos dedos e da imaginação de Buk para existir para todos nós, Crumb cristalizou a nanquim a imagem do escritor.

Não conheço as mulheres de Crumb, o imaginário desse artista além-Buk. Uno ambos como se um sem o outro fosse um corpo sem braço. Ou como uma história do próprio Charles Bukowski sem um palavrão. [x]

RECEITUÁRIO LITERÁRIO :

O CAPITÃO SAIU PARA O ALMOÇO E OS MARINHEIROS TOMARAM CONTA DO NAVIO

A MULHER MAIS LINDA DA CIDADE

MOVIE: Barfly

Ariela Boaventura
Um dia será também uma velha safada


Poesias fotos do Buk podem ser encontradas em http://www.levity.com/corduroy/bukowski.htm

Sobre Crumb: http://www.lambiek.net/1/troptrop.jpg

Fonte: http://www.nao-til.com.br/nao-68/crumb.htm

5 comentários:

Flávia disse...

Sáviooooo...

Eu AMOOO Bukowski. Essa acidez, essa crueza, tão ferina e ao mesmo tempo de sensibilidade tanta. AMO.

Desculpe a demora em deixar um comentário aqui. Eu sempre vinha (desde que começamos a nos falar) mas tava sempre fazendo alguma coisa e acabava não dando tempo de comentar. Serei assídua a partir de hoje ;)

Beijos

Antonio Sávio disse...

Obrigado Flávia. Você sempre é bem vinda.
Bjo.

Carlos Rafael Dias disse...

Duca, brother!

Antonio Sávio disse...

Obrigado pela presença Carlos Rafael. Fico honrado por sua passagem por aqui.

Cellina Muniz disse...

O texto tava bom, mas se o velho Buk visse os comentários, no mínimo diria: "Foda-se!"