Mário Ferreira dos Santos
A razão quis roubar-nos a ilusão, o sonho, a fantasia. A libertação do homem (esse sofredor animal de milénios de tiranias) será iniciada ao quebrar as algemas que a razão, mal orientada, construiu para acorrentar-lhe o espírito.
O homem de amanhã filosofará como Apolo e Dioniso. Então a arte ajudará a redimir os homens, dizem muitos, porque somente pela arte o homem se salvará, mas só quando pela arte puder ser ele salvo.
Para Nietzsche a arte é o "movimento contrário" à decadência que se processa no Oriente. E, para ele, o filósofo "artista" é o conselho mais elevado da arte. É pelo caráter tumultuário de nossa vida de criação, que toda e qualquer tentativa de desejarmos emprestar fórmulas únicas representa uma violentação. Ademais, querer impor uma única perspectiva é colocar-se do ângulo de uma verdade para todos, fora da qual não há salvação. Lutar por suas ideias é um direito e um dever, mas também o é respeitar as alheias. Há um direito de ser diferente, de "não ir por aí". Igualmente em arte seria o perecimento da arte, seria estrangular o poder criativo do artista. Que se orgulhem as rãs de não ter asas, mas respeitem os pássaros em seus voos.
O que devemos desprezar na arte moderna é o artificialismo que se apresenta como elementar, primitivo. É o que sôbre-excede ao natural, o requinte de uma desvitalização, da impossibilidade de criar.
Estamos, inegavelmente, num instante trágico da história humana. Assistimos ao esquecimento de tantas verdades que foram caras à humanidade. Vemos a instalação de uma escala de valores utilitários, que dominou e domina. Há esperanças de algo novo, mas ao mesmo tempo, indecisão quanto às diretrizes desse futuro. A humanidade deseja renovar-se porque cansou de sua descrença. É o fruto de sua longa deserção da vida, porque os senhores da vida não souberam deixá-la viver e gozar em paz o seu quinhão. As camadas mais fracas são sempre as primeiras a sofrer nas horas de sacrifício, de prejuízo e de falta, e as últimas a ganhar nas horas da vitória. Aos erros dos senhores da vida, sobrevêm o sacrifício dos pequenos ...
Devemos desprezar na arte moderna o seu artificialismo, repetimos. E este se apresenta muitas vezes com as cores da originalidade, da simplicidade, do primitivismo. Mero produto consciente de uma eleição desejada, em sua incompletação e em seu esboçar-se, e quer dar a impressão de obra nascida num instante de inspiração. O pintor vazio, que nada tem a dizer, traça três ou quatro pinceladas simbólicas, ou significativas, para repetir um tema já usado, gasto, explorado, para que reflita no espectador o sentir que está na moda.
Nada mais decepcionante do que essas exposições de arte, onde centenas de novos são apresentados sem refletirem qualquer personalidade, copiando mal, e que a crítica fácil depois elogia, classifica, compara, quando não lhes atribui características de genialidade.
Talvez um dia, quando a nossa era for examinada pela posterioridade, a falta de dignidade que se observa em todas as manifestações humanas seja o característico mais saliente que a distinguirá das outras.
A razão quis roubar-nos a ilusão, o sonho, a fantasia. A libertação do homem (esse sofredor animal de milénios de tiranias) será iniciada ao quebrar as algemas que a razão, mal orientada, construiu para acorrentar-lhe o espírito.
O homem de amanhã filosofará como Apolo e Dioniso. Então a arte ajudará a redimir os homens, dizem muitos, porque somente pela arte o homem se salvará, mas só quando pela arte puder ser ele salvo.
Para Nietzsche a arte é o "movimento contrário" à decadência que se processa no Oriente. E, para ele, o filósofo "artista" é o conselho mais elevado da arte. É pelo caráter tumultuário de nossa vida de criação, que toda e qualquer tentativa de desejarmos emprestar fórmulas únicas representa uma violentação. Ademais, querer impor uma única perspectiva é colocar-se do ângulo de uma verdade para todos, fora da qual não há salvação. Lutar por suas ideias é um direito e um dever, mas também o é respeitar as alheias. Há um direito de ser diferente, de "não ir por aí". Igualmente em arte seria o perecimento da arte, seria estrangular o poder criativo do artista. Que se orgulhem as rãs de não ter asas, mas respeitem os pássaros em seus voos.
O que devemos desprezar na arte moderna é o artificialismo que se apresenta como elementar, primitivo. É o que sôbre-excede ao natural, o requinte de uma desvitalização, da impossibilidade de criar.
Estamos, inegavelmente, num instante trágico da história humana. Assistimos ao esquecimento de tantas verdades que foram caras à humanidade. Vemos a instalação de uma escala de valores utilitários, que dominou e domina. Há esperanças de algo novo, mas ao mesmo tempo, indecisão quanto às diretrizes desse futuro. A humanidade deseja renovar-se porque cansou de sua descrença. É o fruto de sua longa deserção da vida, porque os senhores da vida não souberam deixá-la viver e gozar em paz o seu quinhão. As camadas mais fracas são sempre as primeiras a sofrer nas horas de sacrifício, de prejuízo e de falta, e as últimas a ganhar nas horas da vitória. Aos erros dos senhores da vida, sobrevêm o sacrifício dos pequenos ...
Devemos desprezar na arte moderna o seu artificialismo, repetimos. E este se apresenta muitas vezes com as cores da originalidade, da simplicidade, do primitivismo. Mero produto consciente de uma eleição desejada, em sua incompletação e em seu esboçar-se, e quer dar a impressão de obra nascida num instante de inspiração. O pintor vazio, que nada tem a dizer, traça três ou quatro pinceladas simbólicas, ou significativas, para repetir um tema já usado, gasto, explorado, para que reflita no espectador o sentir que está na moda.
Nada mais decepcionante do que essas exposições de arte, onde centenas de novos são apresentados sem refletirem qualquer personalidade, copiando mal, e que a crítica fácil depois elogia, classifica, compara, quando não lhes atribui características de genialidade.
Talvez um dia, quando a nossa era for examinada pela posterioridade, a falta de dignidade que se observa em todas as manifestações humanas seja o característico mais saliente que a distinguirá das outras.
É a decadência que vemos instalar-se em toda a parte. Escritores medíocres competem em glória com sumidades; poetas sem poesia gritam contra a morte da poesia; pensadores sem pensamento afirmam a inanidade do pensar; artistas sem imaginação chamam pela beleza exclusiva da cópia; pintores, que não sabem pintar, usam de uma liberdade de expressão que não expressa coisa nenhuma.
Nunca na história humana se justificou tanto a fábula da raposa sem cauda do que nesta que atravessamos. O homem de valor notório nega tudo quanto não tem. O mau orador nega o valor da oratória; o incapaz de escrever coi sas profundas nega o valor da profundidade; o borra-qua-dros nega o valor da pintura do passado. Improvisam-se genialidades com a rapidez das notícias e das modas.
Três anos bastam para não se compreender nem sentir o corte de uma roupa, o padrão de um par de sapatos. Aos vestidos compridos sobrevêm os vestidos curtíssimos, e vice-versa. Uma estação, para outra, distancia tanto o modo de vestir, como antigamente distanciavam os lustros, os séculos até. É à velocidade que eles emprestam o porquê de tais factos. Propriamente a incapacidade de duração das afeições e gostos nunca foi uma prova de superioridade, e sim de inferioridade. São precisamente os "ventoinhas" que se deixam arrastar pelo agradável do passageiro ou pelo passageiro do agradável.
Não há um sentido dominante de querer a beleza. O provisório ameaça tudo, e ao domínio dos sucessos, dos "big-light-names", sucede o esquecimento sepulcral. Quantos heróis da humanidade esquecidos nesses três decénios, que, dentro talvez de outros três lustros, ninguém mais saberá dizer o que eram.
Mas, de entre cem pequenos artistas supérfluos, um ou outro desponta. Há nomes que vencerão o tempo. Se olharmos vinte anos para trás, veremos na literatura quantas promessas que despontavam e vemos, hoje, quantas realidades dessas promessas que ficaram. E das esperanças de hoje deixemos que sobrevenham mais vinte anos, para que fiquemos sabendo quantas são meras aparências.
O vazio expressional de certa arte é o que determina de início a sua morte. Quem nada diz para a vida ou para os homens, mas apenas explora um sentimento passageiro, uma emoção ou simpatia momentânea, e não fixa, em cores firmes, o que deseja expressar, não conseguirá sobreviver! Muitos artistas proclamam que não desejam ir além de si, e que lhes basta a notoriedade, e que a glória não lhes é o estímulo, e preferem a vitória do momento que passa, cuja fruição lhes está às mãos, e não trocarão o prato de lentilhas do renome pela esperança de serem amados amanhã, e compreendidos por outros, à custa, muitas vezes, da incompreensão de seus contemporâneos. Não os acusemos. São apenas mercadores das emoções e dos gostos transeuntes, embora chamem de novas mensagens as suas obras. Mensageiros da novidade e do modismo. Não pertence aos mercadores o desejo da imortalidade, mas aos estetas.
Em meio desses exploradores da arte, desses valores convencionais, o leitor sente-se perdido. Não sabe escolher, nem guiar-se. O elogio fácil, a glória proclamada de uns por outros, infunde ao leitor a convicção de que encontra pela frente o definitivo. À sua decepção sucedem decepções. Nada lhes dizem de novo. Contam-lhe apenas o que já sabe, o que já está cansado de sentir. Emocionam-no passageiramente, porque lhe despertam os instintos mais facilmente despertáveis, que não lhe deixam, porém, ressonâncias, mas um desgosto que não sabe definir.
Como todas as tendências buscam justificar-se, essas também possuem sua casuística, sua lógica, seus argumentos, suas teorias. Todas atitudes em arte são justificáveis; basta que aceitemos um ou outro postulado. Mas o que marca o valor de uma obra é alguma coisa que está ligado ao tempo. Não é exclusividade de nossa época os literatos que envelhecem em poucos anos. Na velha Alexandria e em todas as culturas, houve milhares de outros, cujos nomes estão no pó dos arquivos. Também foram expressões que ofuscaram. Pertence à história da arte a regra geral de que os artistas que obtêm vitórias fáceis não são os que deixam seu nome como um exemplo. Todo artista, que, ainda jovem, se julga com direito à glória, pratica um ato de juventude, compreensível. Se todos soubessem o perigo que existe na vitória fácil, muitos desejariam a glória tardia de um Romain Rolland, de um Simões Lopes Neto.
Só a maturidade pode conhecer a verdadeira glória. Neste caso, argumentar-se com as exceções de um Castro Alves ou de Álvares de Azevedo não é suficiente, porque exceções.
Há, entre esses artistas modernos, muitos que são apenas mercadores da arte. Há pintores que apenas vendem quadros. Há escritores que apenas vendem livros. É isso uma fatalidade de nossa época, uma fatalidade impressionante, mas que devemos compreender.
Mas não neguemos que esse aspecto puramente mercantil da arte tem sido também um estímulo para grandes obras. A miséria também nos deu grandes inspirações, e é de temer que, para os artistas, a superabundância não lhes afaste da verdadeira musa.
Lembremos que, em Alexandria, havia dramaturgos que eram preferidos a Sófocles, como hoje há dramaturgos preferidos a Shakespeare. Isso não impede que Shakespeare e Sófocles atravessem os séculos, e dos outros fique apenas a memória de sua passagem.
Não somos contra os artistas menores. Quase sempre é menor o artista que se torna grande. Os artistas menores são necessários também para dar relevo aos grandes. A grandeza é apenas uma relação. E que seria dos raros se não fossem os supérfluos?
Deixemos agora falar Spengler: "Que é que hoje chamamos arte? Uma música mendaz, artificioso estrondo de massas instrumentais; uma pintura mendaz, cheia de efec-tismos idiotas e exóticos, mais próprias dos cartazes de anúncios; uma arquitetura mendaz, que cada dez anos saqueia o tesouro das formas pretéritas, para "fundar" um novo estilo, ao qual cada um faz o que lhe dá vontade de fazer; uma plástica mendaz, feia dos roubos perpetrados na Assíria, no Egito, no México. E, contudo, o gosto dos mundanos considera isso como a expressão do tempo actual Ademais o que permanece adito aos velhos ideais, é lúbrica ocupação provinciana". E prossegue: "Em lugar de se pôr ao serviço de seu simbolismo, os artistas utilizam o cadáver, a múmia da arte, o caudal das formas já usadas, para recompô-los, misturando-as, trocando-as por uma forma totalmente inorgânica. Toda a modernidade confunde variação com evolução".
Mas o que sucede hoje já sucedeu muitas vezes na história; nem sequer conserva o cunho da originalidade, a nova musa dos modernos.
Essas palavras de Spengler são o eco, no século vinte, daquelas que, no século dezenove, Nietzsche exclamou, quase quarenta anos antes:
"Do mesmo modo que os velhos recordam a mocidade e celebram festas comemorativas, assim também a humanidade se deixa levar a uma consideração da arte como uma "recordação emocionante" dos prazeres juvenis.
Nunca na história humana se justificou tanto a fábula da raposa sem cauda do que nesta que atravessamos. O homem de valor notório nega tudo quanto não tem. O mau orador nega o valor da oratória; o incapaz de escrever coi sas profundas nega o valor da profundidade; o borra-qua-dros nega o valor da pintura do passado. Improvisam-se genialidades com a rapidez das notícias e das modas.
Três anos bastam para não se compreender nem sentir o corte de uma roupa, o padrão de um par de sapatos. Aos vestidos compridos sobrevêm os vestidos curtíssimos, e vice-versa. Uma estação, para outra, distancia tanto o modo de vestir, como antigamente distanciavam os lustros, os séculos até. É à velocidade que eles emprestam o porquê de tais factos. Propriamente a incapacidade de duração das afeições e gostos nunca foi uma prova de superioridade, e sim de inferioridade. São precisamente os "ventoinhas" que se deixam arrastar pelo agradável do passageiro ou pelo passageiro do agradável.
Não há um sentido dominante de querer a beleza. O provisório ameaça tudo, e ao domínio dos sucessos, dos "big-light-names", sucede o esquecimento sepulcral. Quantos heróis da humanidade esquecidos nesses três decénios, que, dentro talvez de outros três lustros, ninguém mais saberá dizer o que eram.
Mas, de entre cem pequenos artistas supérfluos, um ou outro desponta. Há nomes que vencerão o tempo. Se olharmos vinte anos para trás, veremos na literatura quantas promessas que despontavam e vemos, hoje, quantas realidades dessas promessas que ficaram. E das esperanças de hoje deixemos que sobrevenham mais vinte anos, para que fiquemos sabendo quantas são meras aparências.
O vazio expressional de certa arte é o que determina de início a sua morte. Quem nada diz para a vida ou para os homens, mas apenas explora um sentimento passageiro, uma emoção ou simpatia momentânea, e não fixa, em cores firmes, o que deseja expressar, não conseguirá sobreviver! Muitos artistas proclamam que não desejam ir além de si, e que lhes basta a notoriedade, e que a glória não lhes é o estímulo, e preferem a vitória do momento que passa, cuja fruição lhes está às mãos, e não trocarão o prato de lentilhas do renome pela esperança de serem amados amanhã, e compreendidos por outros, à custa, muitas vezes, da incompreensão de seus contemporâneos. Não os acusemos. São apenas mercadores das emoções e dos gostos transeuntes, embora chamem de novas mensagens as suas obras. Mensageiros da novidade e do modismo. Não pertence aos mercadores o desejo da imortalidade, mas aos estetas.
Em meio desses exploradores da arte, desses valores convencionais, o leitor sente-se perdido. Não sabe escolher, nem guiar-se. O elogio fácil, a glória proclamada de uns por outros, infunde ao leitor a convicção de que encontra pela frente o definitivo. À sua decepção sucedem decepções. Nada lhes dizem de novo. Contam-lhe apenas o que já sabe, o que já está cansado de sentir. Emocionam-no passageiramente, porque lhe despertam os instintos mais facilmente despertáveis, que não lhe deixam, porém, ressonâncias, mas um desgosto que não sabe definir.
Como todas as tendências buscam justificar-se, essas também possuem sua casuística, sua lógica, seus argumentos, suas teorias. Todas atitudes em arte são justificáveis; basta que aceitemos um ou outro postulado. Mas o que marca o valor de uma obra é alguma coisa que está ligado ao tempo. Não é exclusividade de nossa época os literatos que envelhecem em poucos anos. Na velha Alexandria e em todas as culturas, houve milhares de outros, cujos nomes estão no pó dos arquivos. Também foram expressões que ofuscaram. Pertence à história da arte a regra geral de que os artistas que obtêm vitórias fáceis não são os que deixam seu nome como um exemplo. Todo artista, que, ainda jovem, se julga com direito à glória, pratica um ato de juventude, compreensível. Se todos soubessem o perigo que existe na vitória fácil, muitos desejariam a glória tardia de um Romain Rolland, de um Simões Lopes Neto.
Só a maturidade pode conhecer a verdadeira glória. Neste caso, argumentar-se com as exceções de um Castro Alves ou de Álvares de Azevedo não é suficiente, porque exceções.
Há, entre esses artistas modernos, muitos que são apenas mercadores da arte. Há pintores que apenas vendem quadros. Há escritores que apenas vendem livros. É isso uma fatalidade de nossa época, uma fatalidade impressionante, mas que devemos compreender.
Mas não neguemos que esse aspecto puramente mercantil da arte tem sido também um estímulo para grandes obras. A miséria também nos deu grandes inspirações, e é de temer que, para os artistas, a superabundância não lhes afaste da verdadeira musa.
Lembremos que, em Alexandria, havia dramaturgos que eram preferidos a Sófocles, como hoje há dramaturgos preferidos a Shakespeare. Isso não impede que Shakespeare e Sófocles atravessem os séculos, e dos outros fique apenas a memória de sua passagem.
Não somos contra os artistas menores. Quase sempre é menor o artista que se torna grande. Os artistas menores são necessários também para dar relevo aos grandes. A grandeza é apenas uma relação. E que seria dos raros se não fossem os supérfluos?
Deixemos agora falar Spengler: "Que é que hoje chamamos arte? Uma música mendaz, artificioso estrondo de massas instrumentais; uma pintura mendaz, cheia de efec-tismos idiotas e exóticos, mais próprias dos cartazes de anúncios; uma arquitetura mendaz, que cada dez anos saqueia o tesouro das formas pretéritas, para "fundar" um novo estilo, ao qual cada um faz o que lhe dá vontade de fazer; uma plástica mendaz, feia dos roubos perpetrados na Assíria, no Egito, no México. E, contudo, o gosto dos mundanos considera isso como a expressão do tempo actual Ademais o que permanece adito aos velhos ideais, é lúbrica ocupação provinciana". E prossegue: "Em lugar de se pôr ao serviço de seu simbolismo, os artistas utilizam o cadáver, a múmia da arte, o caudal das formas já usadas, para recompô-los, misturando-as, trocando-as por uma forma totalmente inorgânica. Toda a modernidade confunde variação com evolução".
Mas o que sucede hoje já sucedeu muitas vezes na história; nem sequer conserva o cunho da originalidade, a nova musa dos modernos.
Essas palavras de Spengler são o eco, no século vinte, daquelas que, no século dezenove, Nietzsche exclamou, quase quarenta anos antes:
"Do mesmo modo que os velhos recordam a mocidade e celebram festas comemorativas, assim também a humanidade se deixa levar a uma consideração da arte como uma "recordação emocionante" dos prazeres juvenis.
Talvez nunca tenha sido compreendida a arte com tanta profundidade e alma como agora, em que a magia da morte parece envolvê-la. Pensemos naquela cidade grega da Itália meridional, que celebrava suas festas gregas, um dia em cada ano, lamentando-se e chorando ao ver a barbárie estrangeira triunfar diariamente sobre os seus costumes originais; sem dúvida, nunca se saboreou este néctar com tal voluptuosidade como entre aqueles helenos moribundos. O artista passará muito breve por ser um legado do passado, e como um maravilhoso estrangeiro, cuja força e beleza faziam a felicidade dos tempos antigos, render-lhes-ão honras como não as concedemos facilmente aos nossos semelhantes. O melhor que há em nós provém talvez desse sentimento de épocas anteriores, que apenas podemos agora alcançar diretamente; já se pôs o sol, mas ainda ilumina e acalenta o céu de nossa vida, embora não o vejamos mais".
Nós, porém, continuaremos a crer nas madrugadas.
Nós, porém, continuaremos a crer nas madrugadas.
2 comentários:
boquiaberta. :O
fantástico.
Obrigado pela visita moça.
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